domingo, 9 de outubro de 2011

Os Fittipaldis

Não deve haver nenhuma outra classe profissional em Portugal cujos membros, na sua maioria, estejam em tão grande falta de sintonia com a função que supostamente deveriam exercer do que os taxistas do nosso país. Uma corrida de táxi, hoje em dia, é, na maioria dos casos, uma desagradável odisseia. Tudo começa, no caso de zonas de grande afluência de turistas, tipo aeroportos, com a aprovação solene por parte do taxista, caso a “corrida” seja do seu agrado, isto é, uma grande distância a ser percorrida, ou incontida desaprovação, através do sobrolho carregado, brusquidão de gestos ou mesmo lamentos, tipo ladainha, caso o percurso seja curto. Já nos táxis a circular dentro das cidades essa não é uma questão importante pois que os seus condutores estão mais habituados a percorrer pequenas distâncias nos serviços que prestam. Aparte o início da corrida, há que ter nervos de aço para aguentar as velocidades que essas traiçoeiras latas metálicas com rodas, principalmente quando dirigidas pelas mãos de pessoas que nem sequer têm grande habilidade para a condução, alcançam. Dentro das cidades, principalmente naquelas que têm limitadores de velocidade que podem dar origem a multas, é vê-los a reduzir com brusquidão a marcha quando se cruzam com os sensores fotográficos e de seguida a acelerarem, até aos 100km/h ou mais, sem qualquer pudor e respeito pela vida do passageiro para quem estão a prestar um serviço (se dúvidas há é só ir à Avenida Gago Coutinho em Lisboa para o confirmar…). Pior ainda é quando o desagradado cliente lhes chama a atenção para esse facto eles, para além de, entre dentes ou alto e bom som, começarem com impropérios, ainda aceleram mais, tipo macho latino; “a mim ninguém dá palpites acerca de condução pois eu é que sei do meu trabalho!”. Para este tipo de gente muito mal formada, e psicologicamente desarranjada, o óbvio binómio serviço/cliente não está minimamente interiorizado. O desconforto ainda é maior quando estes taxistas, em acelerada marcha por estreitas ruelas, atendem chamadas telefónicas nos seus telemóveis, sem qualquer pudor ou respeito para com as outras pessoas, dentro e fora de portas. Numa outra etapa, o passageiro, para além dos insultos que tem de ouvir da boca desses Fittipaldis de meia tigela para com os outros condutores, ou transeuntes, que são sempre umas "grandes bestas", tem ainda de aturar as verborreias inconsequentes, a maioria das quais totalmente descabidas de sentido, deste tipo de pseudo-filósofos que sobre tudo opinam, quer tenham ou não reflectido um pouco sobre os mais variados assuntos que abordam. Quando termina a viagem começa um outro problema, à noite é mais frequente, que diz respeito à falta de trocos pois que segundo essas cabecinhas pensantes o cliente é que tem a obrigatoriedade de estar preparado para facilitar ao máximo a vida do prestador do serviço. Para concluir, se o passageiro não se mostrou compreensivo ao longo do percurso com os raciocínios do intrépido piloto, se lhe solicitou para que diminuísse a velocidade ou até se lhe pediu para estar calado, pois que a paciência para conceitos primários não é, às vezes, a melhor, então ainda se arrisca a ouvir algumas inconveniências pela sua falta de solidariedade para com o desgraçado que está ali só para fazer o seu trabalho e que ganha uma miséria enquanto os patrões levam tudo e eles é que arriscam a pele a fazer serviços para zonas problemáticas, etc, etc. E isto na melhor das hipótese pois outros há que reagem quer com agressões verbais quer até, nalguns casos mais extremos, físicas...  


A nítida falta de formação, e de urbanidade, destes (pouco) profissionais deveria ser exemplarmente punida, com, por exemplo, a cassação da sua carta profissional de forma sumária caso houvessem testemunhas, de modo a minimizar este tipo de comportamentos que a todos envergonha. Ou então, mais eficaz ainda, introduzir em todos os táxis sistemas de gravação de voz, cujas conversas teriam de estar disponíveis quinze dias a um mês antes de poderem ser destruídas, de maneira a se poder avaliar correctamente uma situação em caso de denúncia por parte do cliente. Para facilitar essa denúncia seria criado um livro de reclamações on-line, ou similar, por exemplo no site da ASAE, específico para este tipo de situações, onde fosse possível escrever uma queixa fundamentada, introduzindo aí a matrícula do táxi e a hora aproximada do serviço, de forma a que as autoridades facilmente fiscalizassem o sucedido e pudessem, caso se comprovassem os factos relatados, responsabilizar directamente, com pesadas coimas, os donos dessas companhias de táxis e punir sem demoras os prevaricadores. Também seria boa ideia obrigar que se instalasse um registo de velocidade nas viaturas, tipo o que os veículos pesados já possuem, de forma a que polícia pudesse ter um maior controlo sobre as infracções desse género pois que isso seguramente reduziria a sensação de mal estar do passageiro e aumentaria a segurança nas estradas portuguesas. Esta tão desprestigiada classe profissional, que se julga impune, embora as autoridades responsáveis tenham finalmente começado a olhar para este problema de uma outra forma, mas ainda com reduzida eficácia, tem de se capacitar que quando os seus membros prestam um serviço, ainda por cima dito público, então têm de se comportar de uma forma correcta pois não faz sentido nenhum que o prestador do serviço não tenha o mínimo respeito pelo seu cliente, o que, num negócio tradicional, seria ruinoso para o futuro do primeiro. É sempre perigoso generalizar mas neste caso específico penso que, infelizmente, a anormalidade é a regra e não a excepção.


fotos: migalha, lda